Como montar um consultório farmacêutico

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A partir das Resoluções 585 e 586 de 2013, do Conselho Federal de Farmácia (CFF), e da Lei nº 13.021/14, começou a surgir um movimento entre os farmacêuticos, ainda que tímido, de montar suas clínicas para prestação de serviços farmacêuticos à população, dentre eles, a prescrição de medicamentos.

Aqueles profissionais que saíram na frente e partiram para a prescrição têm dado depoimentos defendendo a atividade e referindo excelente adesão de sua clientela e até mesmo bons lucros.

Claro que para vender serviços farmacêuticos e dentre eles exercer a prescrição é preciso maior capacitação e certa dose de coragem e empenho, já que a atividade exige conhecimento e muita responsabilidade.

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Grandes redes do varejo farmacêutico já operam seus consultórios em todo o País. No entanto é importante enfatizar que o modelo de consultório farmacêutico independente de farmácias ou drogarias ainda é muito novo. O que tem gerado inúmeras incertezas e perguntas muitas vezes sem resposta assertiva por parte dos órgãos de regulação.

Para os farmacêuticos cujo objetivo é empreender nessa área, o professor exclusivo do ICTQ, Lincoln Cardoso recomenda os principais aspectos a serem observados para a montagem de uma clínica farmacêutica, em 16 passos importantes. Confira todos eles:

1- Exigências iniciais

O primeiro passo para a montagem de um consultório farmacêutico consiste na formação do empreendedor, que deve ser farmacêutico, graduado como Bacharel em Farmácia por uma instituição de ensino superior devidamente reconhecida pelo Ministério da Educação (MEC). Ainda, o profissional deve estar devidamente registrado no Conselho Regional de Farmácia (CRF) da sua jurisdição, e não se encontrar impedido por motivos éticos ou administrativos de exercer a profissão. Este primeiro requisito é fundamental para a consolidação do farmacêutico clínico que busca empreender na prestação de serviços farmacêuticos e de saúde direcionados aos usuários de medicamentos.

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O próximo passo a ser cumprido é o da capacitação. A grande maioria dos farmacêuticos que atuam em farmácias comunitárias e drogarias, públicas ou privadas, no Brasil, não tiveram formação clínica durante a graduação. Isso mudará a partir da conclusão da revisão das Diretrizes Curriculares dos Cursos de Farmácia – processo em andamento atualmente. Portanto, agregar conhecimentos e competências clínicas e em gestão de serviços de saúde é fundamental para o farmacêutico que busca empreender em um consultório.

Outro passo de grande importância: estabelecer de forma bem nítida os verdadeiros objetivos de um consultório farmacêutico. Para isso é necessário um estudo crítico da legislação que regulamente as atribuições clínicas do farmacêutico e a prescrição farmacêutica no Brasil, especificamente as Resoluções 585 e 586 do CFF, ambas publicadas em 29 de agosto de 2013. É recomendável, também, uma releitura da RDC-ANVISA 44, de 17 de agosto de 2009, que dispõe, entre outros temas, sobre a prestação de serviços farmacêuticos em farmácias e drogarias. Completando este estudo preliminar, a leitura analítica da Lei 13.021, de 08 de agosto de 2014, será de grande contribuição para a conclusão quanto aos objetivos de um consultório em relação à prestação da assistência farmacêutica e de serviços em saúde.

Os próximos passos dependerão de uma decisão estratégica: o consultório farmacêutico será implantado dentro da instalação de uma farmácia ou drogaria ou será instalado de forma independente, sem relação ou interligação com um estabelecimento farmacêutico.

No primeiro caso (consultório farmacêutico instalado em farmácia ou drogaria), a regulamentação segue uma via mais simples, pois este estará anexado a uma estrutura já existente e que será regulamentada como um estabelecimento farmacêutico (farmácia ou drogaria) que passa a oferecer serviços na sua prática profissional. Serão necessárias atualizações da documentação quanto às atividades desenvolvidas para os estabelecimentos já em funcionamento ou, em caso de estabelecimentos novos, uma adequada descrição inicial das atividades a serem desenvolvidas quando do processo de abertura do estabelecimento junto à Vigilância Sanitária local. Em ambos os casos, o enquadramento da atividade econômica na Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE se dará por um dos seguintes códigos: 4771-7/01 (comércio varejista de produtos farmacêuticos, sem manipulação de fórmulas); e/ou 4771-7/02 (comércio varejista de produtos farmacêuticos, com manipulação de fórmulas); e/ou 4771-7/03 (comércio varejista de produtos farmacêuticos homeopáticos).

No segundo caso (consultório farmacêutico independente de farmácia ou drogaria) o processo de abertura ainda é incerto. Isso porque não existe um código CNAE que contemple este tipo de atividade especificamente e, ainda, não há uma regulamentação sanitária específica da Anvisa que regulamente ou normatize a infraestrutura mínima e as atividades destes tipos inovadores de estabelecimentos. Assim, o desafio se torna ainda maior para os farmacêuticos empreendedores que se lançam na vanguarda dessa nova iniciativa na prestação de serviços de cuidado farmacêutico individualizado.

Os primeiros consultórios farmacêuticos brasileiros têm sido instalados dentro de farmácias ou drogarias, ocorrendo tanto em grandes redes como também em microempresas, ou ainda, anexados a clínicas que agregam diferentes especialidades médicas entre outros atendimentos de saúde, como nutrição, psicologia, fonoaudiologia e fisioterapia, por exemplo. Os consultórios independentes de farmácias ou drogarias ainda deverão ser regulamentados no Brasil, tanto quanto à atividade econômica específica, quanto aos aspectos sanitários ainda a serem estabelecidos pela Anvisa.

Tendo estabelecido todos os termos abordados anteriormente, o farmacêutico empreendedor contará com dados e argumentos que permitirão o início da elaboração do plano de negócio, que deve considerar o aspecto inovador da iniciativa de se implantar um consultório farmacêutico em uma comunidade que ainda não está familiarizada com este tipo de serviço de saúde, o que ocorre praticamente em todo o Brasil. A qualidade do plano de negócio será essencial para a tomada de decisão de iniciar ou não o empreendimento e mais, caso o farmacêutico empreendedor venha a precisar levantar recursos financeiros para o investimento.

Considerando a necessidade de buscar recursos junto às instituições financeiras, um novo desafio surge: a inovação deste modelo de negócio. Por um lado a inovação é positiva, quando possibilita diferenciação de mercado e conquista de mercados ainda não explorados. Por outro lado, quando se trata de captação de recursos, esta iniciativa pode gerar insegurança na instituição credora no processo de aprovação do financiamento. É neste sentido que a qualidade do plano de negócio poderá contribuir para a expressão da confiança necessária junto aos investidores. Em se tratando de consultórios farmacêuticos instalados em farmácias e drogarias o processo de captação de recursos pode ser mais simples, por configurar uma expansão das atividades do negócio já existente. Quanto aos consultórios independentes, o fato de ainda não haver um código de CNAE específico para esta atividade pode ser um agravante neste processo.

2 – Como se preparar em termos de recursos financeiros

As estratégias devem ser bem diferentes, de acordo com a natureza e configuração do negócio. Consultórios farmacêutico implantados em farmácias ou drogarias podem requerer menores investimentos. Entretanto, esta conclusão é dependente do nível de adaptação necessária na infraestrutura do estabelecimento para receber a nova expansão. Já os consultórios independentes tendem a requerer maior investimento inicial, considerando que precisarão ser submetidos a todo o processo de abertura e regulamentação de uma nova empresa, o que envolve diversos custos com processos e documentação.

Em se tratando da estrutura necessária, ambos os modelos podem ser muito semelhantes. Isto dependerá dos serviços a serem realizados e do potencial de atendimento pretendido. Estas decisões também dependem da avaliação crítica do plano de negócio.

Tomadas as decisões, e feita a planilha de custos, sugere-se que o empreendedor preveja um valor próximo àquele definido para o investimento de implantação destinado ao capital de giro, de modo a sustentar o empreendimento até que se atinja o ponto de equilíbrio econômico e financeiro. Muitos novos empreendimentos fracassam no Brasil antes de completarem um ano de atividade por falta deste tipo de previsão.

3 – Equipamentos necessários

A definição dos equipamentos necessários depende diretamente dos serviços a serem oferecidos. Nesta análise é importante que o farmacêutico empreendedor saiba diferenciar serviços farmacêuticos de serviços de saúde. Os serviços farmacêuticos compreendem basicamente a análise da farmacoterapia, a conciliação de medicamentos prescritos, o manejo de doenças autolimitadas e o acompanhamento farmacoterapêutico. Os principais equipamentos para a prática desses serviços são o conhecimento e a expertise clínica do profissional. Entretanto, o farmacêutico pode se apoiar em um aplicativo informatizado para a gestão dos serviços e em referências bibliográficas de qualidade, entre livros e bancos de dados de informações clínicas na internet.

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Já os serviços de saúde, que complementam e integram os serviços farmacêuticos, requerem instrumentos específicos para a sua realização. São exemplos: esfigmomanômetro com estetoscópio, aparelho determinador de glicemia, insumos para aplicação e administração de medicamentos, refrigerador com controle de temperatura para armazenamento de vacinas, entre outros.

A estrutura geral se assemelha muito a de qualquer outro consultório de cuidado à saúde, envolvendo cadeiras, mesas, computadores, maca, pia com água corrente, entre outros, respeitando a legislação sanitária específica ou aquela que melhor se aplicar.

4 – Necessidade de colaboradores

Esta questão também deve ser respondida de forma diferenciada, dependendo da natureza e modelo do negócio. Os consultórios instalados em farmácias ou drogarias já contarão com o suporte de RH já existente no estabelecimento. Nesses casos, pode ser necessária a contratação de outro profissional farmacêutico, seja para as atividades clínicas, seja para desempenhar as demais funções de responsabilidade técnica.

Em se tratando de consultórios independentes, a estrutura de RH adequada é outra. Parte-se da necessidade de uma secretária, incumbida do agendamento e do controle das informações dos pacientes. Em alguns casos, dependendo dos serviços ofertados, uma auxiliar de enfermagem pode contribuir na realização e procedimentos, como determinação de parâmetros fisiológicos e bioquímicos, realização de pequenos curativos ou ainda na aplicação e administração de medicamentos e vacinas. Em ambos os casos, os serviços devem ser prestados e coordenados por um farmacêutico com formação clínica.

5 – Seleção de pessoal

Caso o empreendedor não seja farmacêutico clínico, o primeiro critério é selecionar um profissional com essa qualificação. Este profissional deve ter competências não somente em práticas clínicas e em farmacoterapia, mas também em gestão, que o permitam atender aos pacientes e administrar todo o processo de cuidado a eles.

Os demais profissionais devem ser selecionados de acordo com os critérios de cada empresa. Entretanto, é importante se avaliar o nível de credibilidade e confiança que esses profissionais depositam nos serviços ofertados, pois serão fundamentais no estabelecimento de relações de cuidado ao paciente.

6 – Período desde o planejamento até a abertura

Este tempo também dependerá da natureza e do modelo do negócio. Entretanto, o ideal é que, em qualquer caso, o tempo entre a elaboração do plano de negócio, a captação dos recursos financeiros, e a conclusão do processo de implantação não ultrapasse seis meses. Este prazo deve ser considerado na incorporação do capital de giro necessário para sustentar o empreendimento até que se atinja o ponto de equilíbrio econômico e financeiro.

7 – O que é essencial na hora de abrir as portas

Basicamente:

• Infraestrutura completa;

• Regulamentação fiscal e sanitária;

• Farmacêutico clínico com competências em gestão;

• Equipe de RH treinada;

• Divulgação à sociedade e aos demais profissionais da saúde da região.

8 – Inauguração

A inauguração pode ser explorada em dois focos: o público-alvo, ou seja, a população em geral; e os profissionais de saúde prescritores. Assim, o importante é demonstrar a natureza do consultório farmacêutico como estabelecimento prestador de serviços de saúde. Campanhas educativas em saúde podem estabelecer melhor esse contexto. O velho e tradicional modelo com palhaços, pipocas, algodão doce e bexigas coloridas pode chamar a atenção, mas não transfere mensagem alguma nem tão pouco marca a natureza do negócio junto ao público-alvo, portanto são desaconselhados.

9 – Divulgação à comunidade

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Esta também deve ser uma abordagem dupla: focada na população e, diferentemente, aos profissionais prescritores. No primeiro caso esclarecendo quanto aos benefícios e vantagens dos serviços oferecidos. No segundo, apresentando as contribuições que tais serviços podem proporcionar à qualidade dos tratamentos dos pacientes.

 

 

10 – O atendimento

Pode-se estabelecer uma sequência mínima de ações que devem ser contempladas na prática do cuidado ao paciente:

a) Atendimento cortez e atencioso pela recepção (seja por uma secretária ou pela equipe de atendimento de uma farmácia ou drogaria);

b) Triagem do paciente. Em farmácias e drogarias isto é importante no sentido de se identificar a real necessidade de se encaminhar o paciente ao serviço farmacêutico. Em consultórios independentes, este processo pode integrar as funções da recepcionista/secretária no sentido de identificar a real compreensão do paciente quanto aos serviços oferecidos no consultório.

c) Acolhimento do paciente. Realizado de forma atenciosa e comprometida pelo farmacêutico clínico, que demonstra verdadeiro interesse em cuidar da saúde do paciente que busca por seus serviços.

d) Acompanhamento. Por meio do estabelecimento de uma metodologia de monitoramento do processo de cuidado ao paciente, considerando suas necessidades individuais.

11 Documentos a serem oferecidos ao paciente

Após cada atendimento, o paciente deve receber a Declaração de Serviço Farmacêutico, em cumprimento ao Artigo 81, Seção III, da RDC-ANVISA nº 44, de 2009, referida anteriormente. Ainda, em caso de prescrição farmacêutica decorrente do serviço de manejo de problema de saúde autolimitado, o paciente também deve receber a primeira via da prescrição emitida, independentemente dessa prescrição conter tratamentos farmacológicos ou não.

Nos casos em que os serviços farmacêuticos são cobrados do paciente, o que deve se consolidar como tendência, o paciente ainda deve receber o recibo de serviços, de acordo com a legislação vigente em cada Estado da federação.

12– Indicação da farmácia para a compra de medicamentos

Essa é uma discussão bastante importante diretamente relacionada à ética profissional. Considerando que uma prescrição farmacêutica seja emitida em um consultório instalado em uma farmácia ou drogaria, não há impeditivos legais ou éticos que impeçam o paciente de adquirir seus medicamentos nesse mesmo estabelecimento. Do mesmo modo, esse cliente não pode ser coagido a fazê-lo, tendo total liberdade para decidir adquiri-los em outro estabelecimento, se assim julgar conveniente.

Em se tratando de um consultório farmacêutico independente de uma farmácia ou drogaria, a indicação de um estabelecimento para a aquisição de medicamentos ou outros recursos terapêuticos prescritos pode incorrer em prática antiética, passível de processo ético-administrativo.

13 – Cobrança pela consulta

A consulta farmacêutica, assim como qualquer outro serviço farmacêutico, deve ser cobrada. Esse é um dos caminhos a ser percorrido na busca do maior reconhecimento profissional do farmacêutico clínico. Todo serviço de saúde de qualidade e prestado com bases na ética deve ser devidamente e justamente remunerado, e nisso se incluem os serviços farmacêuticos.

A determinação dos valores a serem cobrados deve ser o resultado de um estudo de formação de preços, no qual devem ser considerados a natureza e complexidade dos serviços prestados, as condições socioeconômicas do público-alvo, os custos operacionais do consultório e a expectativa de lucro do empreendimento. Deste modo, os valores variam conforme cada realidade. Experiência já em funcionamento, indicam valores que variam de R$ 15,00 a R$ 100,00 por consulta e serviços farmacêuticos prestados.

14- Recibo

É necessário emitir Recibo de Serviço, uma vez que se trata de prestação de serviço em saúde. O recibo deve conter nome, CPF, endereço, carimbo e o CRF ao qual está ligado.

15 – Pós-atendimento

O pós-atendimento é muito importante no sentido de acompanhar os resultados dos serviços farmacêuticos prestados. A estratégia e a qualidade deste acompanhamento estarão atreladas aos princípios e valores da empresa. Quanto ao aspecto clínico, o acompanhamento deve ser parte da metodologia empregada no processo de cuidado dos pacientes, principalmente nos casos de revisão e conciliação da farmacoterapia, do manejo de problemas de saúde autolimitados e do acompanhamento farmacoterapêutico.

16 – Controle da farmacoterapia

O controle da farmacoterapia engloba o monitoramento dos resultados e a identificação de possíveis resultados negativos associados aos medicamentos (RNMs) decorrentes de problemas relacionados ao uso dos medicamentos (PRMs), que podem ser desde o uso incorreto dos medicamentos, reações adversas a estes, e até interações medicamentosas.

A sistemática de acompanhamento e controle dependerão da metodologia de atenção farmacêutica praticada pelo farmacêutico clínico. Entretanto, as formas de comunicação e relacionamento como paciente podem envolver desde consultas frequentes por agendamento, até contatos por telefone e sistemas de mensagens via aparelhos celulares e seus aplicativos.

Fonte: ICQT