Já ouviu falar do paraíso das plantas medicinais?

Oeiras destaca-se no Piauí como um município com notável patrimônio histórico, com casarões seculares, festividades religiosas e a permanência da tradição do uso da vegetação nos cuidados com a saúde e rituais de cura pela população sugere que seja alternativa acessível, rápida e confiável. Uma pesquisa feita na Feira Livre de Oeiras mostra que o uso de plantas medicinais para tratar problemas do dia a dia e até doenças graves continua fazendo parte da cultura dos piauienses.

A pesquisa “Diversidade e Comercialização de Plantas Medicinais na Feira Livre de Oeiras”, da tese de doutorado de Francisca Carla Silva de Oliveira, encontrou 60 espécies de plantas medicinais comercializadas para doenças como Mal de Parkinson, inflamações femininas, sarampo, diabetes e contra veneno de cobras.

A doutora em Meio Ambiente e Desenvolvimento explica que as feiras livres são espaços urbanos que asseguram a resiliência e manutenção dos saberes empíricos sobre as espécies úteis.

“Nestes locais, com características e dinâmicas próprias, ocorrem trocas econômicas, ecológicas e culturais, por meio da comercialização de diversos produtos e serviços, incluindo espécies vegetais para fins terapêuticos”, afirmou a pesquisadora.

Os órgãos vegetais mais vendidos foram folhas (31,36%) e caules (16,56%) e a forma de preparo mais usual foi o chá (decocção e infusão, 27,17% e 18,47%, respectivamente).

Segundo ela, o uso de espécies medicinais foi mencionado como eficiente para o tratamento de doenças físicas e/ou espirituais e a citação mais comum foi para o tratamento de sinais e sintomas de transtornos dos sistemas respiratório e geniturinário.

Francisca Carla Silva de Oliveira afirma que, além do uso terapêutico, 13,8% das espécies foram citadas para uso mágico-religioso. O estudo mostrou que todos os vendedores de plantas medicinais na feira livre residem na própria cidade, sendo esta a fonte de renda principal (71,5%) dos comerciantes.

“A atividade de comercialização das plantas envolve diversas pessoas com funções bem definidas. Verificou-se que os feirantes são reconhecidos como especialistas locais e a feira livre é um importante espaço de manutenção, (re)construção e difusão da cultura local, acerca do uso de plantas medicinais, onde convergem plantas de diferentes origens e que, além da importância econômica para os vendedores, a comercialização de etnoespécies apresenta relevante contribuição socioambiental para o município. As políticas públicas devem incluir estes espaços no estabelecimento de normatização e orientações específicas, que garantam a permanência dos vendedores e o uso seguro e sustentável dos recursos da flora”, acrescentou Francisca Carla.

Plantas medicinais cultivadas em quintais

Tradicionalmente, o uso doméstico de plantas medicinais esteve restrito ao cultivo em quintais nos espaços rurais e urbanos e, com a urbanização, os recursos naturais da flora foram incorporados como produtos na feira livre de Oeiras.

“As feiras livres, enquanto espaços comerciais abertos, públicos e sem delimitação física, emergiram como locais de abastecimento de produtos diversos para a população em geral, dentre eles, as plantas medicinais. Nestes locais, os especialistas locais disponibilizam espécies para usos medicinais e ritualísticos e, ainda, possuem conhecimentos associados ao preparo. Desta forma, as feiras tornaram-se importante espaço de convivência, de manutenção dos saberes construídos historicamente, e em particular, acerca das plantas medicinais, produzindo e reproduzindo a cultura local”, afirma Francisca Carla Silva de Oliveira.

Plantio e venda é tradição familiar

A doutora em Meio Ambiente, Francisca Carla Silva de Oliveira, adianta que o fator determinante para o envolvimento no comércio de plantas medicinais, segundo os entrevistados, foi a influência familiar. Ao serem perguntados quanto às formas de aquisição de conhecimento, 85,7% revelaram que o aprendizado foi adquirido pela transmissão oral com os antepassados (pais, avós e tios), como pelo trabalho na feira livre, referindo aos procedimentos de como dá o uso terapêutico das plantas; já 14,3% acumularam informações na experiência vivida no trabalho na feira livre, com outros vendedores e consumidores, bem como pelo intermédio de programas de televisão, sítios eletrônicos e/ ou livros.

“Assim, ratifica-se que a transmissão do conhecimento relacionado às espécies vegetais medicinais se dá pela evolução cultural, que resulta da combinação: transmissão horizontal (feita entre membros da mesma geração), transmissão vertical (repassado de pais para filhos) e transmissão oblíqua (saberes adquiridos ou transmitidos por diversas fontes), que embora diferentes, não são excludentes”, afirma a pesquisadora.

Ela lembra que estudos mostram que o conhecimento concentrado apenas nas pessoas com idade mais elevada e o não reconhecimento de outros indivíduos como detentores de conhecimento significativo, deve-se à ausência de eventos sociais para socialização e difusão dos saberes.

Os entrevistados relatam que ainda não participaram de curso com orientações voltadas para a comercialização de plantas, porém revelaram interesse, especialmente acerca dos cuidados com manuseio, secagem e armazenamento das partes vegetais, o que, segundo eles, minimizará as perdas e, com isso, aumentará a lucratividade. (E.R.)

Em todas as residências dos feirantes entrevistados, as mulheres são responsáveis pela seleção de espécies vegetais presentes nos quintais para atendimento das necessidades da família (alimentação, ornamentação, mágico-religioso e terapia).

“Vários estudos evidenciam que estes espaços são áreas de domínio das mulheres em região de Caatinga. Situados no entorno das residências, as espécies vegetais medicinais presentes nos quintais (sendo citada a ocorrência de espécies nativas e exóticas), são compartilhadas por familiares, vizinhos e amigos. Os entrevistados revelaram que as trocas e pedidos de mudas são eventos comuns no contexto local e que as espécies não estão incluídas na atividade comercial da feira livre. Neste sentido, os quintais são considerados como espaços de usos múltiplos, influenciados pela vegetação natural e clima local, possuindo por funções a domesticação e aclimatação de espécies e, ainda, conservação da agrobiodiversidade”, adiantou Francisca Carla Silva de Oliveira .

Por outro lado, a venda das plantas é atividade majoritariamente feita por homens e é, predominantemente, de origem rural (57,1%).

“Em estudo em uma área de Caatinga, foi identificada que a idade e gênero influenciam positivamente no conhecimento e usos de plantas nativas, constatando que os homens de mais idade conhecem maior quantidade de etnoespécies nativas e as mulheres de espécies cultivadas nos quintais”.

O estudo mostrou que 63,3% das plantas medicinais encontradas na feira são nativas e 36,7% exóticas.

Mulheres e idosos acreditam mais no poder das plantas

A pesquisadora Francisca Carla Silva de Oliveira afirma em sua pesquisa que os consumidores são, predominantemente, pessoas de menor poder aquisitivo, jovens do gênero feminino, idosos e, em menor número, turistas. Os raizeiros afirmaram que as plantas comercializadas por eles são compradas em Oeiras, Piauí e Picos, extraídas localmente e/ou são originárias de outros municípios (Picos, Santa Rosa e Teresina) ou estados como a Bahia (Juazeiro) e Pernambuco (Petrolina). Isto, segundo os feirantes, ocorre quando há dificuldade em encontrar as plantas de interesse nas regiões próximas a Oeiras. Os desmatamentos      ocasionados pela urbanização e/ou ampliação de áreas agrícolas e pastagens são apontados como fatores que dificultam o acesso às etnoespécies em espaços urbanos”, fala a pesquisadora.

Embora a feira livre seja permanente, os feirantes costumam se deslocar para feiras livres temporárias, sediadas em outros municípios, especialmente para comercialização de seus produtos. O deslocamento dos vendedores para outras localidades do entorno ocorre e são momentos que deixam a barraca aos cuidados de algum familiar ou terceiros. (E.R.)

Plantas medicinais e suas finalidades

A

Acerola (fruto in natura e o suco) é usada contra gripe e é expectorante;

Alecrim é calmante e usada para cura da infecção urinária;

Alecrim-de-passos/alecrim-de-bom-jesus é usado para gripe e é expectorante;

Alho é usado para problemas cardíacos, vermífugos e pressão alta, além de tempero;

Aloe vera, conhecida como babosa, é usado para gripe, é expectorante, sinusite, problemas uterinos, bronquite e dor de dente;

Ameixa é usada no tratamento de inflamações femininas e hemorragia uterina;

Aroeira tem a casca usada em infusão para o tratamento de aroeira inflamações femininas;

B

Batata-de-purga serve para gripe, como expectorante, vermífugo e limpar a pele e problemas intestinais;

Bambural é usado para gripe e sinusite;

Boldo é usado para problemas gástricos, má-digestão, diarreia e é abortivo;

Buchinha ou buchinha-paulista serve para inflamações femininas, abortivo e gripe;

Buriti é usado em casos de picada de cobra, picada de insetos e picada de aranha caranguejeira

C

Cabeça-chata é usada na cura de pneumonia e pedra na vesícula;

Capim-de-cheiro ou folha-santa é usada para o controle da pressão alta;

Capitão-de-campo trata de doenças de récem-nascido e;

Camomila é usada como calmante;

Cana-fliche é usada contra constipação, vermífugo, gripe e ferimentos;

Cansanção ou cansanção-branco é usado para o tratamento de apendicite e dor de dente;

Casca e o suco do angico trata a gripe, é depurativo e trata a disenteria e dores abdominais: o miroró-branco é usado contra o derrame;

Cebola ou cebola-branca é usada para o tratamento de gripe, asma e gases;

Coco tem seu óleo in natura usado em assadura;

Copaíba (óleo in natura) é usado contra dores em geral; a flor e o lambedor da favad’anta são usados contra gripe e atuam como expectorante;

Crista-de-galo é usado para as doenças do recém-nascido, inflamações e diarreia;

E

Endro é usado constipação e como diurético;

Erva-cidreira é usada contra a pressão alta, infecções, má-digestão, calmante e convulsão;

Erva-doce serve como calmante;

G

Guabiraba é usada contra inflamação de garganta; a erva-mate é usada para emagrecimento e gripe;

Girassol: semente  é usada para dor de cabeça;

I

Imburana ou imburana-de-cheiro é usada para a cura da catapora, cólicas infantis, inflamações em geral, erupções dentárias, gripe e serve como antitérmico e expectorante;

J

Jacarandá é usado em problemas hepáticos, problemas gástricos, diabetes, vômito e diarreia;

Jarrinha é usada em inflamações femininas;

Jatobá ou jatobá-preto é depurativo e usado no tratamento da anemia e gastrite;

Jenipapinho é usado para pressão alta, colesterol e diabetes;

Juá é usado para tratamento de diabetes, colesterol e mal de Parkinson;

Jucá ou pau-ferro é usado no tratamento da gripe, é expectorante e usado também no tratamento de diarréia e cólicas intestinais;

Jurema-preta (infusão da casca e a garrafada) é usada para dores abdominais;

L

Linhaça é usada como suplemento alimentar, constipação e inflamações em geral;

M

Mamona serve como vermífugo, para limpar os pulmões e evita a queda capilar e trata a constipação;

Maracujá, maracujá bravo, maracujá-do-mato é usado como calmante;

Maria-preta é usada para tratamento de cólicas e dores em geral;

Mastruz é usado como vermículo, tanto a folha como o suco:

Moleque-duro (folha) ajuda a criança a caminhar;

Mostarda: Semente  é usada para derrame

Mucunã-de-chapada ou mucunã é usada contra gripe e é expectorante;

Mufumbo (flor) e lambedor servem para gripe;

Mussambê (folha) é usada para quebranto, gripe e benzimento;

N

Noz moscada (infusão da semente) é usada para tratamento de derrame;

P

Palma-santa é usada como cicatrizante;

Pata-de-vaca atua contra o ganho de peso, gastrite, diabetes e inflamações;

Pau-de-rato é usado no tratamento de distensão, abdominal e disenteria;

Pequi: Fruto in natura serve para gripe e dor nos ossos;

Pimenta-do-reino é usada no tratamento de inflamação de garganta, problemas cardíacos, vermífugo, pressão alta, rouquidão e tempero;

Pinhão-roxo serve para afastar mau-olhado;

Podói ou podóia ou pau-d‘óleo é usado contra dores em geral e como regulador menstrual;

Q

Quina é usada para tratamento de inflamações femininas;

S

Sabiá é usado no tratamento de derrame;

Sabugueira é usada para sarampo, cólicas infantis, erupção dentária, catapora, inflamações, gripe e febre;

V

Velaminho (raiz e a folha) é usado para febre e gripe

Disponível em: https://www.meionorte.com/blogs/efremribeiro/paraiso-das-plantas-medicinais-331413